Hoje em dia, quase não usamos mais a palavra "hipócrita" - preferimos dizer "falso", "mentiroso"; porém é uma palavra muito rica em significado que vem do mundo grego, onde indicava o ator, que colocava uma máscara para representar o personagem. Por isso, "hipócrita" acaba assumindo o sentido de alguém que representa um papel, alguém que diz com a voz algo que não vem do coração. A hipocrisia é uma ruptura entre o coração e a voz, entre o que se é e o que se diz ser.

Um bispo que viveu há quinze séculos, São João Crisóstomo (354-407), falando da necessidade de não limitar a fé ao culto na igreja, mas de traduzi-la em obras, disse numa homilia: "Queres honrar o corpo de Cristo? (...) Não o honre aqui na Igreja com tecidos de seda, enquanto lá fora você o negligencia quando ele sofre com o frio e a nudez (...). O corpo de Cristo que está no altar não precisa de mantos, mas de almas puras; enquanto o que está lá fora precisa de muitos cuidados. (...) Que vantagem pode ter Cristo se a mesa sacrificial estiver cheia de vasilhas de ouro, enquanto ele depois morre de fome na pessoa dos pobres? Ele primeiro sacia os famintos e só depois decora o altar com o que resta" (Homilias sobre Mateus, 50,3-4).

E um bispo contemporâneo, o cardeal Carlo Maria Martin (1927-2012), comentando o episódio evangélico do Bom Samaritano onde o sacerdote e o levita, depois de verem o homem espancado na beira da estrada, seguem viagem sem cuidar dele, escreveu na carta pastoral "Tornar-se próximo": "Uma Igreja fechada em si mesma, nos seus problemas internos, na sua autopreservação, sente-se muito embaraçada diante das difíceis escolhas que a caridade exige, e recua assustada numa atitude de fechamento, que se torna cada vez mais grave e quase intransponível".

Peçamos ao Senhor que nos arranque a máscara da hipocrisia religiosa e nos leve a viver também fora da igreja, na vida do dia a dia, a riqueza do amor de Deus vivido no altar, na escuta da Palavra de Deus e na mesa da Eucaristia" (Erio Castelluci).