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Tráfico de pessoas: o Estado ausente

O Diário - 18 de junho de 2025

Tráfico de pessoas: o Estado ausente

Tráfico de pessoas: o Estado ausente

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Poucos crimes traduzem tão bem a perversidade humana e a omissão institucional quanto o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual. Em especial, nas regiões de fronteira, como entre Brasil e Paraguai, essa prática se expande na sombra da negligência do Estado, da pobreza crônica e da impunidade. As vítimas – majoritariamente mulheres, adolescentes e crianças – não são apenas exploradas sexualmente, mas também silenciadas por uma sociedade que, em grande parte, ainda as vê como culpadas ou invisíveis.

É preciso ser claro: o tráfico de pessoas não é apenas uma questão criminal, é uma afronta direta à dignidade humana. Trata-se de um fenômeno complexo, que se alimenta da desigualdade social, da violência de gênero e da ausência de políticas públicas efetivas. Na fronteira entre Brasil e Paraguai, essa realidade ganha contornos ainda mais graves. A fluidez da circulação entre os países, aliada ao frágil controle estatal, transforma a região em terreno fértil para redes criminosas transnacionais. Essas organizações atuam com alto grau de sofisticação, enquanto o Estado segue desorganizado e, muitas vezes, ausente.

É fundamental destacar que não faltam instrumentos legais. O Protocolo de Palermo, ratificado pelo Brasil, estabelece um marco internacional importante no combate ao tráfico de pessoas, inclusive com foco na exploração sexual. A Constituição Federal brasileira, ao consagrar a dignidade da pessoa humana como um dos pilares da República, deixa evidente a obrigação do Estado em proteger essas vítimas. No entanto, o que vemos na prática é um abismo entre o que está escrito na lei e o que se realiza nas ruas das cidades de fronteira.

Mais grave ainda é a dificuldade em aplicar esses marcos legais de forma coordenada. Brasil e Paraguai possuem legislações que, embora caminhem na mesma direção, divergem em aspectos cruciais – como a definição de consentimento da vítima, a responsabilização dos aliciadores e a extraterritorialidade das penas. Isso compromete a eficácia da cooperação jurídica internacional e permite brechas para a impunidade.

O combate ao tráfico de pessoas exige muito mais do que endurecimento penal. Requer políticas públicas integradas, que atuem na prevenção, proteção e reintegração das vítimas. É preciso investir em educação, geração de renda, acolhimento humanizado e ações permanentes de combate à violência de gênero. Também é essencial capacitar profissionais da segurança pública e da justiça para identificar e acolher essas vítimas com respeito e empatia, rompendo com a lógica punitivista que, muitas vezes, revitimiza quem já perdeu quase tudo.

A sociedade também tem seu papel: denunciar, acolher, exigir dos governos ações concretas. O tráfico de pessoas não pode mais ser tratado como um problema distante ou marginal. Ele está mais próximo do que imaginamos e afeta a todos nós. Ignorar sua existência é contribuir, mesmo que indiretamente, para a perpetuação desse ciclo de violência.

O silêncio é cúmplice. A omissão é criminosa. O enfrentamento ao tráfico de pessoas na fronteira Brasil –Paraguai precisa sair da retórica e se transformar em prioridade real. Enquanto isso não acontecer, continuaremos contabilizando vítimas – e perdendo, como sociedade, mais do que podemos suportar.

Gabriel de Andrade Martins Marques 

Danielly Girdzyuska 

Alexandro Da Silva Machado 

Maria Clara Menezes Alves 

Rebeca Monique dos Santos

Ana Luíza Rodrigues Soares de Oliveira Alcides 

Flavia Alepique