Manhãs de maio
O Diário - 27 de junho de 2025

Cláudia Martins de Lima
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Um pássaro cantou lá no alto da minha árvore. Tem um silêncio e um frio que só sinto no outono. O céu está limpo, mas não está radiante.As árvores não se mexem.Um cachorro late sem parar. O som está tão distante que parece minha imaginação. Nesse silêncio sepulcral das manhãs de maio eu posso viver minhas memórias.
Eu usava uma blusa azul de lã que uma namorada do meu irmão deu pra ele...eu tinha uns 14 anos. Como serviria nele? Era minha blusa de dormir preferida. Ela era azul piscina e bem na altura do peito tinha uma faixa branca com a letra “C” de Cícero. De Cilma. De Cláudia. Eu tinha que chamar Cimara, Cilene, Cibele. Minha irmã quis Cláudia. Ainda bem. Lá nos meus 14 anos, minha mãe usava um roupão azul escuro atoalhado e sentávamos à mesa com nosso café preto e o pão congelado que esquentávamos no forno com manteiga. Quando eu me formei mudei de cidade num domingo e não tomei mais café da manhã com minha mãe diariamente. Nós não choramos na despedida. Nos olhamos como quem olha sorrindo. Uma estava dentro da outra. Nós nunca nos separamos, ainda agora, comi um pedaço de pão com ela.
Lá fora alguns pássaros estão respondendo para aquele primeiro pássaro. O cachorro parou de latir. Vou molhar as plantas da minha mãe antes que o sol fique mais forte.