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A sabedoria Divina

Diocese de Barretos - 20 de dezembro de 2025

A sabedoria Divina

Por Pe. Matheus Flávio, Vigário Catedral, Barretos-SP

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A sabedoria divina, tal como compreendida no horizonte bíblico, revela um caminho que ultrapassa a simples busca humana por conhecimento. Nos povos do Oriente Próximo Antigo, Egito, Mesopotâmia e ambientes siro-fenícios, a sabedoria era entendida como arte de viver bem, disciplina moral e capacidade de orientar a própria existência segundo a ordem do mundo. Embora esse ambiente cultural tenha influenciado Israel, a tradição bíblica reinterpretou essa noção de modo singular: a verdadeira sabedoria não é apenas fruto da experiência humana, mas dom de Deus, origem e fundamento de todo discernimento. Assim, “o temor do Senhor é o princípio da sabedoria” (Pr 1,7), expressão que indica não medo, mas relação de reverência, confiança e obediência. Nos livros sapienciais, a sabedoria aparece como dimensão participativa da própria vida divina, iluminando a inteligência humana e orientando a prática da justiça. Em Provérbios, ela é apresentada como guia para a vida reta; em Eclesiastes, como crítica às ilusões humanas; em Sabedoria, como força que atua na criação, na história da salvação e na vida dos justos. Progressivamente, essa sabedoria adquire traços quase pessoais: ela está “ao lado de Deus”, participa da obra criadora e deseja conduzir os seres humanos ao caminho da vida (Pr 8,22-31). Não se trata, portanto, de uma qualidade abstrata, mas de uma presença ativa que manifesta Deus como aquele que guia, ilumina e salva. Além disso, a sabedoria divina é sempre reveladora. Deus não permanece distante; Ele se dá a conhecer por meio de sua Palavra, por sua ação criadora e pela história de Israel. A sabedoria permite interpretar os acontecimentos à luz do agir de Deus e reconhecer, no cotidiano, o seu desígnio. Por isso, a literatura sapiencial une reflexão racional, experiência histórica e fé. Em Israel, pensar bem é viver em aliança, e viver em aliança é deixar-se conduzir pela sabedoria do Senhor. Essa compreensão abre caminho para a revelação cristã. A sabedoria do Antigo Testamento não é um fim em si mesma: ela prepara a plenitude da revelação, onde a sabedoria eterna de Deus assume rosto humano. A tradição cristã reconhecerá que, em Jesus Cristo, essa sabedoria se tornou presença visível, palavra viva e caminho de salvação. Assim, a sabedoria divina, longe de ser conceito abstrato ou simples virtude moral, é o modo como Deus comunica sua verdade, orienta sua criação e conduz a humanidade ao cumprimento do seu desígnio. Em sua origem, finalidade e dinâmica interna, a sabedoria é participação na própria vida de Deus, que continua a instruir, iluminar e transformar o coração humano.