A natureza como cultura
O Diário - 5 de setembro de 2025

José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo
Compartilhar
A sociedade caminha para sua extinção, aparentemente sem se dar conta do que isso significa. Os alertas começaram na década de setenta do século passado. Cientistas hoje lamentam sua timidez e conservadorismo ao não abusarem do catastrofismo. As mudanças climáticas se converteram nas emergências que hoje o mundo inteiro não sabe como enfrentar.
A minha geração, quase toda ela, muito hipócrita e negligente, folclorizou o ambientalismo, tachou os ecologistas de “ETs”, disseminou a ideia de que o planeta sempre atravessou ciclos de alterações e subsistiu. Não entende, até agora, que não é o planeta que corre risco. Ele continuará, como discreto e obscuro corpo celeste. Quem está ameaçado de sucumbir é a vida. Principalmente a humana.
Há quem sustente ainda existir uma tábua de salvação. Ela depende de uma coesão universal, a conscientização coletiva dos bilhões de humanos que continuam a se comportar como se nada pudesse acontecer para acabar com a farra do consumismo.
Poucos os seres sensíveis que enxergam a realidade e que se mostram angustiados, aflitos e até desesperados. Os que puderam fazer algo para coibir a insensatez foram os artistas. Sua ligação íntima com a transcendência os torna suscetíveis de reações insólitas. Um nome a ser cultuado é o de Frans Krajcberg, (1921-2017), um amigo de verdade do verde. Nos anos 1980, ele percorreu a floresta amazônica na região do rio Juruena, em Mato Grosso. Apanhava os troncos carbonizados pelo fogo e os convertia em obras de arte. O seu intuito era emocionar quem se defrontasse com aquelas parcelas da natureza vitimadas pela sanha dendroclasta do bicho-homem.
Seu processo criativo era gêmeo univitelino da natureza. Ele sempre repetia: “Gosto mais de árvores que de pessoas”. Ele sabia que os humanos foram capazes de exterminar semelhantes, pois era judeu polonês, teve a família vitimada no horror da Segunda Guerra Mundial e associava os incêndios florestais que viu no Brasil, à carnificina dos nazistas.
Sua vida foi retratada num livro de João Meirelles, cujo título emprestei para esta reflexão que o reverencia como artista e visionário.