Esqueci minha senha
A Palavra de Deus e o Silêncio

Diocese de Barretos - 25 de setembro de 2025

A Palavra de Deus e o Silêncio

A Palavra de Deus e o Silêncio

Compartilhar


Por Pe. Ronaldo José Miguel, Reitor Seminário de Barretos.

A tradição cristã nos ensina que a Palavra de Deus não é apenas um conjunto de letras impressas na Sagrada Escritura, mas o próprio Verbo eterno do Pai, Jesus Cristo (cf. Jo 1,1-14). Na teologia católica, a Palavra é viva, eficaz e atual (cf. Hb 4,12), capaz de tocar os corações e iluminar os caminhos da história. Contudo, para que essa Palavra seja verdadeiramente acolhida, é necessário um terreno interior que a receba: o silêncio. Em uma cultura saturada de ruídos, dispersões e vozes múltiplas, o silêncio aparece como um ato contracultural e profundamente espiritual. Os Padres da Igreja já afirmavam que “Deus fala no silêncio do coração”. O episódio de Elias no Monte Horeb ilustra essa verdade: o profeta não encontra Deus no vento impetuoso, no terremoto ou no fogo, mas no sopro suave (cf. 1Rs 19,11-12). Assim também a Palavra divina não se impõe pelo barulho, mas se revela no silêncio que sabe escutar. O próprio mistério da Encarnação é expressão desse dinamismo. O Filho, Verbo eterno, nasce no silêncio da noite em Belém, em um presépio escondido, longe dos palácios e do barulho do mundo (cf. Lc 2,1-20). A Palavra que cria e sustenta o universo vem envolta no manto do silêncio e da humildade. Na liturgia, essa dinâmica se atualiza: a proclamação da Palavra é sempre precedida e seguida por momentos de silêncio, para que não seja apenas ouvida, mas acolhida e meditada no coração, como fez Maria (cf. Lc 2,19). O silêncio não é vazio, mas presença. É espaço onde a Palavra de Deus desce como semente e encontra terra boa para germinar (cf. Mt 13,1-23). Sem o recolhimento interior, corremos o risco de ouvir sem escutar, de ler sem compreender, de proclamar sem deixar que a Palavra nos transforme. São João da Cruz recorda que “o Pai falou uma única Palavra, que foi o seu Filho, e sempre a pronuncia em eterno silêncio; e em silêncio deve ser ouvida pela alma”. Aqui se revela o núcleo da espiritualidade católica: a Palavra só frutifica quando acolhida no recolhimento contemplativo. O Papa Bento XVI, na Verbum Domini, recordou que a Igreja deve educar os fiéis a valorizar o silêncio na liturgia e na vida espiritual, pois somente assim a Palavra poderá ser plenamente escutada e vivida. A Palavra de Deus e o silêncio não se opõem; ao contrário, completam-se. A Palavra é semente, e o silêncio é o solo. A Palavra é voz, e o silêncio é escuta. A Palavra é revelação, e o silêncio é contemplação.