“A rico não lhe devas e a pobre não prometas” (parte II)
O Diário - 4 de novembro de 2025
KARLA ARMANI MEDEIROS, historiadora e titular da cadeira 7 da ABC - @profkarlaarmani
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Alfredo Ellis era médico e deputado federal por São Paulo. Era a figura a quem Raphael Brandão deveria procurar para solicitar a elevação de Barretos à comarca, conforme as recomendações do cel. Almeida Pinto, conhecido político no meio republicano. Este escreveu uma carta ao dr. Alfredo, e provavelmente essa recomendação foi o que possibilitou o encontro de Raphael com o deputado. Além disso, o comerciante Alberto Moreira, também do meio político, colaborou nessa intermediação.
A intenção de Raphael era solicitar o apoio do deputado para sedimentar a criação da comarca de Barretos, tão insistida pelos habitantes que tinham de recorrer à Justiça de Jaboticabal, então sede de comarca. Frente a frente com o dr. Ellis, Raphael fez-lhe o pedido, e ele respondeu que quando a situação política se modificasse (referindo-se à saída de Deodoro da Fonseca e outros líderes), a comarca de Barretos seria criada. Raphael, então, sem rodeios, teria lhe dito: “Dr., a rico não lhe devas e a pobre não prometas...” Alfredo Ellis confirmou sorrindo a promessa. Ao sair, novamente diz Raphael: “- Olhe, dr. desculpe eu repetir: - A rico não lhe devas...”, respondendo o deputado: “– E a pobre não prometas. Fico bem certo disso. Vá tranquilo.”
Dias depois, com a dita mudança política no cenário nacional, Raphael Brandão escreve a Alfredo Ellis. Este, por sua vez, responde que não se esqueceu da promessa e que a comarca de Barretos estava criada, inclusive citando a frase: “A rico não lhe devas e a pobre não prometas”. Porém essa resposta, assim como outra que Alfredo Ellis escreveu a Raphael, foi entregue ao cel. Almeida Pinto, que as perdeu. Por isso, Raphael não havia recebido a confirmação da criação da comarca. Diante da demora e da falta de notícias, ele resolveu voltar à capital, novamente rumo à estrada, e lá tomou conhecimento do que havia acontecido. Após isso, finalmente, a comarca foi instalada.
Interessante que quando vemos o documento oficial de criação da comarca, nada se imagina desses bastidores de aventuras, paciência e desencontros. Que bom que existem as fontes memorialistas para nos brindar com esses momentos. Sejam reais ou não, esses diálogos fazem sentido e tornam tudo mais saboroso. E humano. [fim].



