Novos truques de um velho vilão
O Diário - 1 de junho de 2025

Dr. Rodrigo J.C Santiago CRM-SP 129870 / RQE 69441| Médico formado em 2007 pela Universidade de Marília-SP | Pneumologista pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo-SP, com título de especialista pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) | Diretor médico da ABRA (Associação Brasileira de Asmáticos)
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Inegavelmente, dentre as drogas lícitas, o cigarro (como “causador” do tabagismo, e das várias doenças subsequentes), é o maior vilão do ser humano. Nas últimas 3 décadas, mais de 200 milhões de mortes foram causadas pelo uso do tabaco, além dos mais de 1 trilhão de dólares com os custos econômicos anuais decorrentes dele. No nosso país, para cada R$1 de lucro da indústria do tabaco, gastamos cinco vezes mais com doenças relacionadas ao fumo (segundo dados do Ministério da Saúde).
O uso do tabaco é a causa de morte mais evitável em todo o mundo e atualmente é responsável pela morte de um em cada 10 adultos em todo o mundo. O tabaco mata mais de 8 milhões de pessoas todos os anos, e nem vou falar sobre toda a destruição que causa ao nosso meio ambiente... E é ainda o principal fator de risco para mortes e dos anos de vida perdidos por incapacidade do homem (segundo o indicador DALY - Disability-adjusted life year, em tradução livre: Anos de vida ajustados por incapacidade).
Mas não temos apenas más notícias, em brilhante levantamento de dados por Urrutia-Pereira e colaboradores, publicado em 2021 no Jornal Brasileiro de Pneumologia, verificamos que entre 1990 e 2019, houve uma redução significativa na prevalência do tabagismo ativo entre homens acima de 15 anos de idade em 135 países (66%), mas entre mulheres em apenas 68 países (33%). As maiores reduções ocorreram no Brasil, sendo 72,5% entre os homens e 74,7% entre as mulheres. Neste sentido podemos afirmar que, apesar de todas as mazelas do nosso país, o Brasil é (foi) exemplo nas políticas de saúde contra o tabagismo.
O desenvolvimento e a implementação de fortes políticas de controle do tabaco levaram a progressos na proteção dos jovens e na redução do número de jovens fumantes em alguns países.
O Brasil teve a maior redução na prevalência do tabagismo em indivíduos entre 15 a 24 anos, com uma redução na prevalência de 74,5%, variando de 27,5% em 1990 para queda até 7,01% em 2019! Porém agora está novamente aumentando nos últimos anos, principalmente devido ao cigarro eletrônico.
Apesar do sucesso brasileiro, a prevalência do tabagismo ativo entre os jovens na maioria dos outros países continua elevada, e está associada ao aumento do uso destes cigarros eletrônicos, os ditos “produtos de vaporização”, o que coloca em risco o progresso alcançado. Em cima disso, a temática deste ano de 2025 do Dia Mundial Sem Tabaco, criado em 1987 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é justamente alertar que estes produtos mais “modernos”, brilhantes, doces, coloridos... escondem más intenções, e precisamos desmascarar este novo apelo da indústria do tabaco, que já está por trás destes novos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs), e que focam, principalmente nos jovens. Precisamos alertar, não só os nossos jovens (já rebeldes e inconsequentes, até pela própria idade imatura que carregam), mas, principalmente, os pais, mães, avós, tios e tias, de que os cigarros eletrônicos, vapes e pods (deem os nomes que quiserem) são, nada mais, do que o mesmo veneno em nova embalagem, em roupagem diferente. Sim, é o lobo em pele de cordeiro.
Nossa preocupação com os jovens se dá pelo fato de que 82,6% dos fumantes atuais começaram o hábito entre 14 e 25 anos de idade. O início do uso do tabaco antes dos 20 anos de idade destaca a oportunidade única de direcionar os esforços de prevenção entre os jovens, salvar milhões de vidas e evitar futuros custos de saúde. Ou seja, da mesma maneira que a indústria do tabaco escolheu o alvo deles (os jovens), nosso principal inimigo a ser combatido, é justamente esta nova (e “moderna”) arma desta maléfica indústria: os cigarros eletrônicos.