O custo invisível dos sobreviventes do trânsito
O Diário - 4 de maio de 2025

Carlos D. Crepaldi Junior. Advogado especialista em Gestão e Direito de TrânsitoEx-Conselheiro do CETRAN-SP . Diretor da ABATRAN
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No Brasil, o trânsito mata quase 35 mil pessoas por ano. Entretanto, um drama ainda maior permanece praticamente invisível, o dos sobreviventes que ficam com sequelas permanentes. São mais de 150 mil brasileiros que, todos os anos, perdem membros, mobilidade e autonomia em acidentes que, na maioria das vezes, poderiam ser evitados.
Boa parte desses sinistros resulta de decisões imprudentes de motoristas. Excesso de velocidade, embriaguez, ultrapassagens indevidas ou uso do celular ao volante são alguns dos exemplos. A responsabilidade individual é inegável, mas não se pode ignorar a omissão do Estado.
Até agosto de 2024, mais de 234 milhões de infrações de trânsito foram registradas no Brasil, revelando um sistema que multa em larga escala, mas pouco investe em amparo às vítimas. Só na cidade de São Paulo, a arrecadação com multas passou de R$ 1,6 bilhão em 2023. Apesar disso, faltam investimentos em educação de trânsito, centros de reabilitação e apoio aos sobreviventes, que muitas vezes enfrentam sequelas permanentes sem assistência adequada.
O problema vai além da imprudência individual. O Estado também falha ao não aplicar os recursos arrecadados em políticas públicas que façam diferença. Continua punindo, mas sem proteger. E enquanto a máquina arrecadadora funciona, e bem, quem sobrevive aos acidentes segue pagando, todos os dias, o preço de um sistema que negligencia o cidadão.
O trânsito brasileiro é doente porque opera entre extremos. A imprudência de quem dirige e a negligência de quem deveria proteger mas que não investe em educação, tampouco em infraestrutura adequada para evitar sinistros. Não basta punir quem erra; é preciso cuidar de quem sobrevive. Uma sociedade que ignora seus feridos está condenada a continuar mutilando seus próprios membros, no sentido mais literal da palavra.