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O poder da invisibilidade

O Diário - 5 de março de 2024

O poder da invisibilidade

Mario Luiz Ribeiro - Advogado, professor universitário, Mestre e Doutor em Direito - e-mail: [email protected]

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Seguramente já pensamos: ”Imagina se eu conseguisse ficar invisível? Eu estaria ali, ouvindo tudo o que falam e ninguém me veria”.

Mas, a invisibilidade não é um poder tão difícil assim de ser alcançado. É preciso um empenho, uma roupa própria, jeito de agir, uma certa ocupação e... a pessoa deixa de ser vista, deixa de existir, deixa de ter nome, mesmo estando ali.

Mas como é possível?

Há uns 15 anos o psicólogo e pesquisador da USP Fernando Braga da Costa apresentou sua dissertação de mestrado narrando sua experiência de, por 10 anos, ter vestido uniforme e trabalhado como gari. Constatou que até seus amigos não conseguiam vê-lo.

Sua tese comprovou uma recorrente “invisibilidade pública”, em que a percepção humana fica prejudicada e condicionada à divisão social do trabalho, pois se enxerga somente a função, não o ser humano.

Se do ponto de vista antropológico esse é um ângulo, outra é a referência a partir da visão teológica.

Há uma passagem bíblica de Lucas (Lc 16, 19-31) em que o pobre, doente, pedinte, tem nome. Ele se chama Lázaro. E em contrapartida, o rico, de roupas finas e elegantes não tem nome. Ele é só um rico!

A indiferença à pessoa por conta de sua classe social, de seu trabalho, da fragilidade de sua saúde, de sua roupa deve ser um defeito de fabricação dos seres humanos, que ficam dissipados ou diminuídos à medida que passamos a nos interessar por saber o nome, conhecer os perrengues, as dificuldades daquele que, socialmente ou economicamente, está abaixo. E isso nos torna mais próximos do que é divino!

Ao invés de colocar em lados opostos antropologia e teologia, o melhor fazer um ponto de vista contribuir com o outro.

Fica, assim, a sugestão de reflexão sobre a realidade que vivemos e, ainda que experimentando divisões sociais, tenhamos a divina possibilidade de, pelo menos, saber o nome de quem contribui na minha vida. Quando todos descobrirem isso a invisibilidade acaba.

Apesar de ser utópico, como seria bom se isso acontecesse!

Mario Luiz Ribeiro - Advogado, professor universitário, Mestre e Doutor em Direito - e-mail: [email protected]