Quem, assim como eu, compartilha de uma visão liberal sobre a liberdade de expressão, e assim se perfila mais ao modelo norte-americano em vez do modelo alemão acerca do tema, deve ter estranhado o título do artigo. Mas explico. 

Isso porque, mesmo no modelo norte-americano, no qual a liberdade de expressão, ainda que extremamente ampla, não é absoluta, e possui limites. E um desses limites se encontra na incitação à prática de atos violentos. E é justamente um caso desse que me levou à reflexão desse artigo. 

No último sábado, uma dupla inglesa de punk rap chamada Bob Vylan demonstrou um comportamento lamentável em um show em Amsterdam, que, a meu ver, extrapolou o direito à liberdade de expressão.

Durante a apresentação na capital holandesa, o líder da dupla, comentando o brutal assassinato do ativista Charlie Kirk, comentou que “Because if you talk shit, you will get banged. Rest in peace, Charlie Kirk, you piece of shit”, que pode ser traduzido, de uma forma mais polida, para algo como “se você falar besteira, você vai tomar um tiro. Descanse em paz, Charlie Kirk, seu traste”. Até aí, poder-se-ia argumentar que ele estava exercendo sua liberdade de expressão, ainda que de forma bastante reprovável e agressiva, mas sem entrar no campo do direito penal. Poderia – na verdade, deveria – responder “a posteriori” por sua odiosa fala, sobretudo na forma de indenizações à família do morto, por exemplo.

Entretanto o duo foi mais longe, e minutos após essa deplorável fala, puxou um coro gritando “danem-se os fascistas, danem-se os sionistas. Vão procurar eles nas ruas”, isso em uma cidade que, vale lembrar, presenciou chocantes episódios de selvageria contra judeus após um jogo de futebol em novembro do ano passado. Nesse contexto de polarização política, no qual “quem não concorda comigo é fascista ou comunista”, a manifestação da dupla é um exemplo clássico da transposição dos limites da liberdade de expressão, uma vez que houve uma clara incitação à prática de atos violentos contra determinado grupo de pessoas. E isso não deve ser admitido, nem mesmo, repito, pelo liberal prisma norte-americano da liberdade de expressão.