Reflexão aos colegas Cirurgiões Dentistas
O Diário - 7 de setembro de 2025

Rogério Ferreira da Silva: é cirurgião-dentista
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Gostaria de propor uma reflexão sobre os rumos que a odontologia tem tomado, especialmente no que se refere à substituição de dentes naturais por implantes. Temos visto, com frequência crescente, uma tendência de remoção de dentes que ainda poderiam ser preservados, muitas vezes com a justificativa de facilitar a instalação de protocolos sobre implantes. Isso é preocupante.
Historicamente, a odontologia levou anos para evoluir e desenvolver técnicas eficazes para restaurar o osso perdido em decorrência da perda dental. Foram avanços fundamentais, como regenerações ósseas guiadas, uso de biomateriais e enxertos, entre outros. No entanto, o que estamos assistindo recentemente é uma espécie de corrida no sentido oposto: a remoção deliberada de grandes volumes de osso saudável — às vezes mais de 5mm nos maxilares — apenas para viabilizar reabilitações com próteses sobre implantes.
Isso precisa ser debatido com responsabilidade. Nada é mais precioso na odontologia do que a estrutura dentária natural. A presença do próprio dente, com seu ligamento periodontal, propriocepção e função, oferece ao paciente conforto, estabilidade e uma sensação de pertencimento que nenhuma prótese é capaz de reproduzir plenamente. Já ouvi de colegas — e repito sempre — que comer com dentadura é como ir a um churrasco com garfo e faca de plástico: até pode funcionar, mas está longe de ser o ideal.
Nosso papel, enquanto profissionais da saúde e cirurgiões-dentistas, deve ser o de restaurar a função e preservar ao máximo o que é natural. Isso exige diagnóstico preciso e criterioso. Antes de qualquer decisão drástica, é essencial que se avalie:
- As condições sistêmicas do paciente;
- Sondagem periodontal e presença de sangramento;
- Grau de mobilidade dental;
- Presença e volume de placa e cálculo;
- Compatibilidade entre os achados clínicos e o diagnóstico de uma possível doença periodontal.
Somente com esse olhar completo é que podemos entender a real gravidade da situação e definir o plano de tratamento mais adequado.
Na imensa maioria dos casos, é possível e recomendável iniciar por uma abordagem conservadora — o que chamo de “periodontia raiz”: remoção de fatores locais, reeducação de higiene, raspagens adequadas, manutenção ativa e constante acompanhamento. Muitas vezes, com esse tratamento de base, conseguimos estabilizar o quadro, preservar os dentes e manter o paciente funcional, sem mutilações desnecessárias.
A odontologia moderna precisa voltar a valorizar a preservação. O paciente, quando sente que manteve seus dentes e sua estrutura, também mantém sua autoestima, sua funcionalidade e sua saúde em longo prazo. E isso é o que realmente importa. Implante é ótimo, mas dente é melhor!