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Silva: da cadeia às telas

O Diário - 6 de maio de 2025

Silva: da cadeia às telas

PROFª ESP. KARLA ARMANI MEDEIROS historiadora, professora de História e titular da cadeira 7 da ABC www.karlaarmani.blogspot.com / @profkarlaarmani

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Eram os anos iniciais da década de 1940 e a cadeia pública de Barretos recebia mais um preso. À época, a prisão se localizava na esquina da avenida 15 com a rua 18, num edifício antigo de 1910, que de tão bela arquitetura parecia um “castelinho”. Transferido da cadeia de Colina para Barretos, quando ele chegou os demais encarcerados disseram: “Temos companheiro! Temos mais um canário para cantar na gaiola”. 

José Antônio da Silva era seu nome. Era trabalhador rural numa fazenda próxima a Colina, e, segundo seus relatos, depois de perseguido por outro funcionário do local, que declarava ter a intenção de matá-lo, foi preso após ter-lhe ferido gravemente quando aquele o procurava com um revólver na mão. Depois de passar um tempo na detenção de Colina, foi transferido a Barretos. Sobre isso, declarou em suas memórias: “E eu fiquei muito mais contente do que na cadeia de Colina porque nesta cadeia de Barretos havia uma ótima instalação sanitária, e os encarcerados podiam fazer as suas necessidades sem pedir a ninguém. Tomava água da boa, muito bem limpa e asseada. O xadrez era outra coisa, muito limpo, com muita higiene. Enfim, os presos gozavam uma certa regalia, que na cadeia de Colina não havia. A gente podia conversar uns com os outros, e contar bastante histórias. Afinal, se distrair algumas horas”. 

Essas memórias foram escritas por ele, em 1949, em seu livro “Romance de minha vida”, pois, nesse momento, o ex-trabalhador rural e ex-presidiário havia se tornado um reconhecido pintor de arte naif (arte primitivista moderna) por críticos de arte. Sagrou-se como um pintor do Brasil rural, de seu folclore, religiosidade e paisagens, e hoje a cidade de São José do Rio Preto possui um museu com seu nome, com um acervo de 67 telas. Silva não se esqueceu de Barretos, no final dos anos 1950, ele doou à recente Pinacoteca Municipal, criada pela professora Maria Aparecida Bernardes Tasso, duas preciosas telas de sua autoria. Hoje, elas pertencem ao acervo do Museu Ruy Menezes, mas são guarnecidas pela Secretaria Municipal de Cultura. Dignas de apreciação e interesse.

De fato, a gente nunca imagina o destino de quem pode estar por detrás das grades. O futuro de Silva virou um belo passado a ser contado; e um presente a Barretos.